segunda-feira, 21 de dezembro de 2009

Sábado em um bar...



E lá pelo décimo cigarro, ela veio até minha mesa, e fez uma pergunta totalmente inusitada. Passara a noite inteira recusando as investidas de todos os que estavam no bar.
Loira, um metro e sessenta e no máximo cinqüenta e seis quilos. O perfume era dos mais comuns, mas adquirira um significado etéreo no pescoço alvo e sensual daquela senhorita. No pulso direito, pulseirinha com pingente de peixe. Nos olhos, uma sombra levemente esverdeada. Na boca, batom leve e muita atitude pra dizer o que queria.
- `Posso? – perguntou já tirando meu maço de cigarros da mesa e sacando um cigarro.
Acendeu o cigarro, o primeiro trago, e a pergunta. – Você está sozinho? Respondi que sim, também acendendo um mentolado. -Você esta sentado ai, bebendo, seus amigos circulando pelo bar, inclusive mexendo comigo. Por que você esta tão pensativo? É casado?
- Bem, a minha onda acabou. Andei bebendo por todo o dia, e estou um pouco entediado agora, afinal o que pode acontecer num bar à noite?
Ela girou a cabeça pelo bar, analisando todos os homens e mulheres.
- Tanta gente procurando o prazer, a satisfação e a aventura, nesse que talvez seja o lugar mais propício para se voltar acompanhado pra casa, ou mesmo se embriagar e dizer vantagens que não se tem, querendo conquistar algum tempo de euforia carnal, e você se senta, bebe, fuma e não interage com ninguém? O que te ocorre pensador?
- Compartilho de suas idéias... De certo, nada melhor que sentir-se desejado, e ser objeto da felicidade de alguém que sequer conhecemos direito. Em um mundo tão cruel, é um ato de benevolência egoísta dar-se a qualquer pessoa. Comprar seu lote no céu através da volúpia! Um brinde as pessoas assim!
Foi esse o momento da transfiguração da garota. De súbito, lançou-me a pergunta:
- Não me acha atraente? Não gostas do que vê? Porque é o único que não me cobriu de elogios e galanteios nesse bar?
- Pura e simplesmente, porque não precisas das minhas palavras. Já ouviu de todo mundo o quanto és linda, fizeram todas as piadas, todos os gracejos, eu sequer tenho algo original pra te dizer no momento. Serve de consolo se te disser que dou validade a cada cantada que você recebeu essa noite?
Ela riu, soprou a fumaça em meu rosto e me disse. – Não, não serve a menos que você vá embora comigo.
Pagou a minha conta, puxou-me pela mão bar afora, enquanto todos olhavam com inveja. Entramos em seu carro, rumo a um bairro de luxo da cidade.
O portão verde e imponente da casa se abriu. Entramos pela garagem, o carro parou. A porta do carro aberta, ela sai, eu também. Entramos pela cozinha, branca, bancada de mármore ao centro, ofereceu-me um café e um conhaque. Aceitei prontamente. Debruçada sobre a bancada com o decote como destaque, meus olhos passearam de maneira mundana por tão belos montes.
- Agora me olhas com desejo. E sei que me queres. Fato. Sinta-se orgulhoso, pois foi você quem arrecadou o prêmio da noite.
E qual homem, mortal não daria o sorriso que dei de canto de boca, pensando na excelente história para os amigos e amigas no dia seguinte? Verdade seja dita, meu ego sentiu-se como a muito não sentia. Eufórico, tomei o conhaque, e toquei-lhe a boca acolhedora e profana.
Um misto de decepção, fúria e desejo percorreu meu corpo já tão cansado pelas horas de boêmia dos dias anteriores. Toda a bebida consumida anestesiou a dor de tantos acontecimentos. A cor do ambiente transmutou para um vermelho e a sensação exata era de pular do alto de uma montanha rumo ao chão distante. Dar-se a vida novamente.
Então, como num passe de mágica, um velho filme me veio à cabeça. Ali mesmo, no meio da cozinha da linda estranha, eu pude ver um copo muito semelhante ao que Ela mais gostava. Esse foi o gatilho para separar minha alma do corpo. O corpo funcionava ferozmente, ainda mais efetivo, no entanto a alma entrava em retrocesso.
Já na rua, voltando pra casa a pé para aproveitar as primeiras horas da manhã, o troféu vinha constantemente em minha memória, e a expressão de surpresa dos meus amigos da noite quando fui selecionado vencedor do evento da noite, conseguia me animar um pouco. Teria muito para contar logo mais.
Mas a sensação de que minha alma ainda não havia voltado continuava. E um nó na garganta me acolheu subitamente. Parei no posto de gasolina e abri mais uma lata de cerveja. Eram sete e meia da manhã.

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